Disco sem preço



Eles provaram que não é preciso de gravadora para lançar um disco de sucesso. Em seu sétimo álbum, a banda inglesa Radiohead inovou na forma de comercializar seu trabalho. In the rainbows será lançado no dia 3 de dezembro como um box, contendo as músicas em CD, um disco duplo de vinil e um CD multimídia com faixas adicionais, fotos e letras. Mas qualquer um pode ter acesso às dez músicas do disco baixando pela internet no site da banda. Partindo da idéia “it´s up to you”, cabe a quem faz o download estipular quanto quer pagar pelos arquivos digitais. É você quem coloca o valor que acha que o CD vale, mesmo que seja zero libras.

Musicalmente falando, In the Rainbows preserva as características do Radiohead e mantém a personalidade da banda. Está tudo ali: as letras depressivas, os arranjos melodiosos, além dos elementos eletrônicos e a multiplicidade de sons simultâneos. Mas não é fácil de ser digerido. Não há singles, as músicas são fragmentadas, há ruídos e barulhos que nos obrigam ouvir mais de uma vez antes de sermos capazes de formular qualquer opinião.

As sonoridades não convencionais provocadas por sintetizadores, saindo do básico vocal, guitarra, baixo e bateria, deixam o álbum mais interessante. A propósito, o Radiohead decidiu disponibilizar no download todas as faixas porque consideram que ficar ouvindo músicas isoladas desvirtua a idéia de seqüência. Afinal, o CD foi feito para ser ouvido inteiro, na ordem em que as canções estão. Esse é purismo do Radiohead. Essa é a arte de fazer música independente de ter uma gravadora ou não.

O Contrato




Depois daquele dia, estabeleceu-se um acordo tácito entre aqueles dois mundos. Era a quarta ou quinta vez que se viam, que conversavam, que riam juntos. Ninguém forçou a barra. Ela, calma e boa de papo, olhava diretamente para os olhos dele. Ele, por sua vez, não tinha más intenções, nem primeiras, nem segundas e nem terceiras. Era simplesmente conhecer gente nova e fazer amizades.

Mas aquele último encontro selou o pacto. Só com o pensamento, com o sentimento, com a emoção, guardaram o beijo para a próxima vez. Nem precisariam falar nada. O encontro macio dos lábios seria o bastante para dizer tudo sem nada. O gesto é comunicação. O silêncio também.

A relação assumiu a característica do duelo calado. Vieram os joguinhos; o fazer de conta; o não ver que o outro estava presente; o desviar de olhos; e conversas rápidas, apressadas, pelo corredor, entre uma tarefa e outra do serviço cotidiano. Tão atarefados estavam que ele não dava bola para ela e ela não se interessava por ele. Mentira! Interessar interessava. Faltava coragem em admitir. Ele, idem. O acordo era quieto, frágil em suas bases não-verbais. Os jogos matam qualquer relacionamento. Por que têm de existir? Orgulho? Vaidade?
















Uma semana. Duas. Três. Nada de nada. As conversas cada vez mais rápidas, os olhares furtivos desviados assim que o outro levantava os olhos. Risinhos nervosos, tensos, fingindo não rir do que o outro falava, mas de uma piada que acabara de se lembrar. O fim.

Enfim, uma festa com o pessoal do trabalho. Ambiente descolado, alegre, feliz. Os copos de cerveja rolando. Dourados e com espumas. Brilhantes. Como quem não quer nada, depois de certo nível alcoólico no sangue (nada muito preocupante), ele chega junto. Tudo bem? Ela está bem, e responde-o aos ouvidos:

- Não faz isso – sussurra, falando uma coisa, querendo outra.

Ele chega mais ainda. As assinaturas do acordo se mantêm. Invisíveis. Caladas. Até se encontrarem no tão sonhado beijo macio, suave, ébrio. Ligeiramente ébrio.

Ninguém disse a ele que o acordo tinha prazo de vencimento. Acabou depois daquela noite, quem sabe naquela noite mesmo, logo após voltarem do mundo do beijo bêbado.

Nas outras festas, cada vez mais freqüentes para “alegrar” e “socializar” os funcionários, ela mostrou que era espécie de agiota e financiadora. Não adianta notas promissórias. Ela não deve nada. Não era só com ele que mantinha acordo, mas com muito mais gente do que se poderia imaginar. Acordos tácitos com vencimento em um dia. O prazo final. Depois disso, venceu. Não vale mais. Ela venceu ou venceu ela?