Hoje a noite, aqui na selva...

Sempre achei que O Rei Leão não era filme para crianças. Apesar de ser desenho animado e um musical típico dos estúdios Disney, como em A Bela e a Fera, o filme tem uma história mais profunda, que expressa angústias, medos, incertezas e lições que temos de enfrentar em algumas fases de nossas vidas. Quando vi o filme pela primeira vez, logo que estreou nos cinemas – em 1994 -, tinha sete anos e adorei, embora tenha achado a história triste. Anos depois – com um olhar mais maduro, espero -, vejo o filme de forma diferente: um roteiro complexo que explora, na fábula animal, as peculiaridades e os problemas que nós, seres humanos, encaramos na vida real.

Dirigido por
Roger Allers, Rob Minkoff, a história se passa na savana africana, onde acompamos a jornada de um jovem leão chamado Simba até a idade adulta. O filme começa com o nascer do sol e o aparecimento de vários animais típicos daquele ambiente - rinocerontes, girafas, zebras - ao som de uma mistura de ritmos africanos e da belíssima música “Ciclo sem Fim”. Daí vem o babuíno Rafiki e “batiza” o pequeno leão, filho do rei Mufasa e da rainha Sarabi. É então que o enredo nos leva pelos caminhos do destino de Simba.

O roteiro, escrito a seis mãos por
Irene Mecchi, Jonathan Roberts, Linda Woolverton, dialoga com textos bíblicos: a história de Moisés, que assim como Simba foi criado em berço real e teve que fugir para o exílio, de Josué – sucessor de Moisés que leva o povo de Israel à Terra Prometida. E, principalmente, o roteiro segue os passos de Hamlet, uma peça de teatro escrita por William Shakespeare, por volta de 1600. Assim como na peça, está presente a ameaça familiar, retratada em O Rei Leão pelo irmão do rei, Scar, a presença do fantasma do patriarca e, sobretudo, a grande questão do “ser ou não ser”.

Simba, depois da morte do pai, foge do reino do qual seria o sucessor natural, deixando a “coroa” para seu tio Scar, que governa em companhia das hienas – a parte musical em que ele planeja a morte do rei é elaborada com tons escuros e cores frias que, assim como sua juba negra, dão a tonalidade do mundo de sombras que o tio malévolo representa. Simba encontra, então, duas criaturas que ensinam uma lição filosófica: “Quando o mundo vira as costas para você, você vira as costas para o mundo”, diz Timão. E é daí que surge a lição de vida “Hatuna Matata”, que significa “sem problemas”: resolver os problemas ou deixá-los para trás. A música “Hatuna Matata” é simplesmente demais: muito bem escrita e animada pelos amigos inseparáveis Timão, um suricate, e Pumba, um javali.

É interessante como os animadores desenvolveram certas cenas, como na parte em que Simba vai ao “reino das sombras” e Mufasa o repreende. Pouco antes da bronca, tem-se a grande pegada do rei em contraste à pequena pata do filho, evidenciando que o pai tem mais experiência e que o filho deve, de alguma forma, respeitá-lo e ouvi-lo.

O personagem Simba, com o passar da projeção, se desenvolve: no começo é uma “criança” (filhote, tá bom) arrogante, que sabe que é herdeiro de um reino animal vasto e acha que, por isso, pode mandar em todo mundo, o que inclui o pássaro azul amigo do rei, Zazu.

Assim, também merece destaque a parte em que Simba, já crescido, vive em seu mundo de alegria com Timão e Pumba e, para “acordar” recebe uma paulada de Rafiki. Essa paulada serve para que o leão se lembre de quem ele é e para chamar a atenção para os ensinamentos do velho rei Mufasa: “olhe para dentro de si, Simba” – a resposta não está no exterior, mas em nós mesmos, evidenciando o caráter amplo e filosófico de um filme que, a primeira vista, parece simplesmente uma nova animação bonitinha dos estúdios Disney.

A riqueza do filme vem, também, da trilha sonora. A música é de Hans Zimmer, Elton John e Lebo M. São ritmos épicos e de ópera misturados com tons africanos que transmitem a liberdade do mundo animal nas savanas. Os números musicais são recheados por boas sacadas e coreografia de, como se diz por aí, encher os olhos. O filme foi indicado para quatro Oscars: trilha sonora e pelas canções originais "Circle of Life", "Hakuna Matata" e"Can You Feel the Love Tonight", esta última levando a estatueta dourada junto a de melhor trilha sonora.

Curiosamente, o filme era para ser um especial da National Geografic em versão animada, mas foi muito mais do que isso. Com uma história interessante – na verdade um enredo antigo, mas com roupagem nova -, trilha sonora de altíssimo nível e mensagens que superam quase tudo o que já foi passado por outros filmes da Disney, O Rei Leão é um filme para ficar na memória. Mas não se esqueça: Rafiki, não deixe o Simba cair. “Hatuna Matata”.

Um comentário:

robertojk disse...

REALMENTE ESSE FILME VAI MAIS ALEM DO QUE UM SIMPLES DESEJO...SIMBA NASCEU PARA SER REI E EM SEU EXILIO ESQEUCEU DE QUEM ERA REALMENTE