Jornaleiros

- Deixa de ser uma mulher dessa aí pra virar um esqueleto humano – diz um homem de aproximadamente 30 anos, vestido de camisa pólo azul e uma barba por fazer.
- É! E mulher depois de sair do sol na praia vira um espetáculo – responde outro homem, de aparência um pouco mais velha, com o sotaque carregado de quem vive há muito tempo na Ilha de Santa Catarina.

Esse diálogo acontece dentro da banca de jornais e revistas chamada “Banca Trindade”. Localizada em frente a um supermercado - bem próxima à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) - a banca tem mais de quinze anos. “Quando eu era criança essa banca já existia. Eu passava por aqui”, lembra Augusto Miranda, o rapaz que é o administrador do negócio.

A banca não é pequena. Além de vender diversos jornais e revistas de todos os tipos, também são comercializados guloseimas, cigarros, sorvetes e alguns livros. Enquanto converso com Augusto, muitas pessoas nos interrompem:

- O senhor tem o jornal “A Notícia” aí?
- Tem cigarro Carlton?
- Quanto custa esse chicabon aqui?

Mas ele explica que isso não acontece com qualquer banca de jornal. “Depende do ponto que se tem. Tem uma banca lá embaixo que fechou. Não dava lucro”, diz apontando para a rua.
O movimento, de fato, é intenso na região. Além do supermercado sempre cheio de gente entrando e saindo, a Universidade traz alunos que sempre consomem jornais e revistas. É assim que a “Banca Trindade” tem seu lucro.

Por trás de dois administradores que se revezam no comando das vendas está quem realmente montou a banca. Augusto o chama de Batman. “Hoje ele vive escondido na sua toca. Só sai para receber o dinheiro”, afirma Augusto se referindo ao empregador. E quando pergunto se ele gosta de trabalhar na banca, ele é categórico: “Eu gosto é do meu patrão”.

Para abrir uma banca de jornal, o primeiro mês é financiado pelo próprio dono. A partir daí se consegue as publicações por meio de empréstimo consignado, ou seja, as mercadorias são entregues para serem negociadas com terceiros – os clientes. O que não vender é recolhido pelas editoras.

No Brasil são cerca de 40 mil pontos de venda, segundo a Associação Nacional de Jornais (ANJ). Estão em todo o lugar: shoppings, estações rodoviárias, perto de supermercados, escolas, faculdades, no metrô. Já tomaram parte da paisagem e se tornaram algo corriqueiro.

No Brasil, esse tipo de comércio é herança dos italianos, espanhóis e portugueses, que abriram as primeiras bancas brasileiras durante o século XIX. Mais do que simples ponto de venda, elas são pontos de encontro para conversa ou descontração, como nos bate-papos informais em que pessoas que nunca se viram antes conversam sobre os mais diferentes assuntos, de mulheres bonitas até o campeão de futebol, de culinária, novelas e viagens.

Augusto não fala qual o rendimento da banca. “Aí depende. Cada mês é diferente. O lucro de uma banca não é fixo, mas sempre tem que pagar luz, telefone e aluguel”.

- Mas como é trabalhar em uma banca de jornal? Deve ter horas em que não tem nada pra fazer. – eu pergunto, interessado.
- Vixi. Que nada! É duro porque não fica parado. Tem dias que fica cliente até as dez, mas daí eu fecho. Não passo de dez horas [da noite]”, diz Augusto. “A única hora livre é das sete e quinze da manhã até umas oito e meia. E só. Depois é só correria”, completa.

Assim que acabo de pegar as informações básicas ele olha pra mim e pergunta: “Ei, tu não quer abrir uma banca, quer?”.

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