Veja o Jornalismo

Costume comum nas universidades é o hábito da discussão. Na faculdade de Jornalismo, sempre tem alguém (talvez a maioria) que busca a profissão como forma de interferir no mundo, ajudar a tornar as coisas melhores ou mais justas, fazer alguma diferença. Comum, também, é a crítica aos grandes veículos de comunicação, em que a campeã das revistas semanais de informação é Veja.

Na edição dessa semana (Edição 2007 .9 de maio de 2007), a revista traz uma matéria que trata da relação entre governo e as centrais sindicais (A triste face do neopeleguismo). Logo na abertura, percebe-se o tom da “reportagem”. Depois de falar das ausências do presidente Lula nas festas de 1º de maio e afirmar que, na última, não houve nenhuma crítica ao governo – críticas que historicamente marcam as festas do Dia do Trabalho -, a revista conclui:

“Portanto, a explicação mais lógica para a ausência de Lula talvez seja outra: é desnecessário lutar pelo apoio dos sindicalistas e das centrais sindicais. Eles já estão, quase todos, aninhados no bolso do governo.”

A matéria fornece dados informando a quantidade de dinheiro que o governo do PT enviou à CUT (Central Única dos Trabalhadores) e à Força Sindical. Compara com informações do governo Fernando Henrique Cardoso, e, logo em seguida:

“A diferença é que o presidente Lula, além do dinheiro e da sua natural proximidade com o meio sindical, no qual começou a construir sua vida pública, ofereceu aos membros da elite sindical o que eles nunca tiveram antes: cargos no governo.”

A verdade da revista é única e universal: Lula deu cargos no governo para membros da elite sindical. A acusação está aí. Cadê as provas?

“Estima-se que a CUT, desde que Lula tomou posse, tenha preenchido cerca de 1 000 cargos de confiança no governo federal. Em julho de 2005, essa relação foi coroada com a entrega do Ministério do Trabalho ao então presidente da CUT, Luiz Marinho.”
(...)
“Com isso, o governo, que já absorvera a CUT, engoliu também a Força Sindical. O atual presidente da entidade, o deputado Paulo Pereira da Silva, vive em Brasília com uma lista de indicações para cargos públicos embaixo do braço. Tem tido sucesso na sua missão.”


Sobre a distribuição de verba às centrais sindicais:

“A medida só não foi anunciada ainda porque uma central menor, a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), não gostou do critério de distribuição segundo o qual os sindicatos indicariam as centrais para as quais querem que o dinheiro seja destinado. CUT e Força Sindical, como são grandes, acham o critério justo.”

Eles acham o critério justo? Verifiquemos, então, os entrevistados pela revista. Vamos ver. O único é o professor de sociologia do trabalho da Unicamp Ricardo Antunes, autor de nove livros sobre trabalho e sindicalismo, que conclui "Isso é o neopeleguismo do social-liberalismo. É um pouco mais sutil, mas é farinha do mesmo saco."

A matéria acaba sem nenhum contraponto, nenhum compromisso em escutar as pessoas envolvidas no processo. De acordo com o professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor), Elias Machado,a revista volta a uma prática antiga de jornalismo. “A Veja reintroduz, em pleno século XXI, uma prática jornalística do século XVII, que é o jornalismo de tese e opinião”.

As opiniões de um grupo poderoso, como o que controla a revista Veja, são difundidas nas matérias jornalísticas da revista. Agora, eu pergunto: isso é Jornalismo? As discussões não podem só ficar nos corredores da universidade.

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