Revista Realidade (1966-1968)

Tive a oportunidade de ler, na hemeroteca do curso de Jornalismo da UFSC, a revista Realidade, que foi produzida mensalmente entre 1966 e 1968.

Essa revista, realizada pela editora Abril, foi um marco na história do jornalismo brasileiro. Uma linguagem inteligente, textos interessantes (em sua maioria, não-factuais, ou seja, não relacionados a fatos; matérias não presas aos assuntos efêmeros da notícia) e jornalistas brilhantes fizeram Realidade se tornar uma inovação e ser lembrada até hoje.

A revista prioriza bastante o texto escrito. Além disso, ela é bem extensa (as reportagens tem várias páginas e são muitas para o padrão atual), ainda para uma publicação mensal. De qualquer forma, trata-se de um texto que te prende da primeira à última linha, sobretudo pelos aspectos irreverentes, como rimas e boas sacadas.

Li um texto de Hamilton Ribeiro, chamado “De Agrado também se morre” (Agosto de 1966), sobre uma série de assassinatos em Uberaba, Minas Gerais. As mortes eram decorrências de envenenamento que um grupo de quatro mulheres praticava dando agrados (doce de mamão, feijoada, bolinhos) a seus desafetos. A abordagem é cativante, e Ribeiro possui um texto sublime, como no trecho:
“Numa feijoada de sábado, lá foram os três, famintos e inocentes, comer gostoso pela última vez”.

Outro texto primoroso é o de Carmen da Silva em “O Conflito de Gerações” (Setembro de 1967). Ela trata da dicotomia jovens x velhos, mostrando que a história se repete desde, provavelmente, o tempo das cavernas: o novo querendo se sobrepor ao antigo, formar novos valores, novas convicções e diferentes modelos de vida. Os jovens são radicais: ou oito ou oitenta. Sua rebeldia põe em questão e discute as estruturas vigentes. Ainda assim, é um assunto que dura por décadas e tem o final parecido: ou se adapta ou continua guerreando, com clareza, inteligência e perspicácia, como fazia Bertrand Russel, um importante ativista político liberal, filósofo popularizador da filosofia e matemático. São coisas que a Realidade ensina...

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