Pequena Miss




















Filmes de pequeno orçamento, via de regra, têm poucas chances de sobreviver no mercado de cinema, ainda mais no grande circuito cinematográfico que começa em Hollywood e, de lá, se espalha pelo mundo. Mas, felizmente, há exceções. Afinal, um gordo orçamento não garante um bom filme.

Little Miss Sunshine é um caso típico de filme barato – para os padrões da indústria – que se sobressaiu e conquistou espectadores e a crítica. Com um orçamento de US$ 8 milhões, esse projeto é um exemplo de luta e determinação. Os realizadores demoraram cinco anos para finalizar o filme, justamente por problemas financeiros. Mas a espera valeu a pena: Little Miss Sunshine arrecadou cerca de US$ 50 milhões apenas nos Estados Unidos.

Os diretores estreantes Jonathan Dayton e Valerie Faris – pelo roteiro original de Michael Arendt – contam a história de uma família norte-americana. O pai, Richard (Greg Kinnear) tenta lançar um livro de auto-ajuda através da técnica “9 passos para o sucesso”. Para ele, todas as pessoas do Universo se dividem em dois grupos: os vencedores e os perdedores. A mãe, Sheryl (Toni Collette), é a mediadora dos temperamentos à flor da pele que toma conta dos membros da família. O avô (Alan Arkin) usa drogas e só pensa em mulheres. O tio, Frank (Steve Carell), é homossexual e vai morar com a família Hoover depois de ter tentado o suicídio. O irmão mais velho, Dwayne (Paul Dano), que faz voto de silêncio até conseguir se tornar piloto da Força Aérea Americana. E, por fim, a pequena Olive (Abigail Breslin), a caçula. A história vai unir a família rumo a um concurso de beleza no qual Olive tem o sonho de participar: o “Pequena Miss Sunshine”.

Para isso, eles vão pegar uma kombi e atravessar os Estados Unidos, dirigindo até o destino final. Nessa jornada, quem ganha destaque é, justamente, Olive. É ela quem une todas as pessoas da família e ela todo mundo respeita. É o poder da filha caçula.

As brigas são freqüentes, mas nada se compara ao drama de Dwayne. Usando camisetas do tipo “Jesus estava errado”, o garoto usa cabelos quase tapando os olhos e odeia tudo, inclusive a própria família. O não-falar dele é angustiante, pois sabemos que ele tem muito a dizer e não diz. Pior, ele vai guardando sentimentos tão fortes que acaba se corroendo por dentro. É aí que surge o talento de Paul Dano (injustamente não indicado ao Oscar). Toda a angústia e rancor do personagem são passados ao espectador, de modo que não condenamos o garoto por seus atos de ódio, mas desejamos urgentemente que ele se recupere, solte aquilo que sente. Temos vontade de gritar por ele e isso nos causa aflição, sobretudo quando o garoto anota em um bloco de notas aquilo que deseja comunicar. Como na cena em que, percebendo que a mãe começa a chorar ele simplesmente escreve no bloco “vá abraçar a mamãe” e mostra para a irmã. Ele, que estava ao lado da mãe, é incapaz de abraçá-la ou demonstrar um gesto de afeto por achar que aquilo seria um gesto de fraqueza de sua parte.

O filme é daqueles que valorizam muito a interpretação. Assim, os atores têm matéria-prima farta para desenvolver seus personagens, o que o fazem com eficiência. Mas o grande destaque fica mesmo por conta da pqeuena Olive. Abigail Breslin a interpreta com tamanha doçura e carisma, que dado momento da projeção nos vemos naturalmente torcendo para ela e nos emocionando com isso. A garota une a família Hoover e também une o espectador com o filme.

Há apenas um aspecto que destoa do resto da produção. No final, o que acontece com Dwayne não é coerente com o personagem que fomos conhecendo no decorrer da trama. Ele vai evoluindo e se transformando, mas depois parece que o roteirista se entrega à simpatia que o filme adquire e esquece de dar um contorno lógico ao personagem.

De qualquer forma, Little Miss Sunshine é muito interessante de se assistir. Um filme não só agradável, mas de certa forma reflexivo: como cuidamos da nossa família? O que significa fazer parte de uma família e zelar por ela? Afinal de contas, a família – e não me refiro somente aos laços sanguíneos - é o princípio de tudo, a base de tudo aquilo que pretendemos construir.

O filme foi indicado aos Oscar de Melhor Filme, Ator Coadjuvante (Alan Arkin), Atriz Coadjuvante (Abigail Breslin) e Roteiro Original. Os diretores são um casal, e não sei por que cargas d´ água não foram indicados. O melhor filme não deveria ter o melhor diretor? A visão que tiveram do enredo foi, talvez justamente por serem marido e mulher, balanceada sob o ponto de vista da família. Conseguiram fazer um filme emocionante, sensível e independente.

Mais: destaque para a cena comovente que mostra os irmãos sentados e, ao fundo, o resto da família e a Kombi – que vira um personagem com a função de agregar todos os outros.

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