Emilio do Cinema

“A Argentina tem uma educação preconceituosa. Pode falar que não, que você se dá bem com todos, com o chinês, com mulato. Isso até você ver três negros sentados juntos”.

Entrei na sala de Emilio, o secretário/supervisor do curso de Cinema da Universidad Nacional de Córdoba, sem a intenção de sair de lá conhecendo mais sobre o país em que estou vivendo desde março. Com seu jeito frouxo de pronunciar as palavras, ele fez uma comparação interessante entre Argentina e Brasil, e revelou o que sentiu quando foi ao Brasil pela primeira vez, em 1982, e viu os negros que são raros em grande parte da Argentina.

“Negros argentinos? A gente quase não vê. Você viu algum em Córdoba? Se viu foram um ou dois e pode ser que não sejam argentinos.”

E mudando de assunto, mas não de tema: “O Brasil é um país mais plural. Na Literatura, por exemplo, há uma produção de Norte a Sul que representa o país, de certa forma. E os roteiros de televisão refletem isso quando adaptam as obras literárias para a TV. Aqui, mesmo os grandes da Literatura – Borges, Cortázar, Sábato -, refletem o pensamento de Buenos Aires. Claro que Buenos Aires tem 20 milhões de um total de 40 milhões de argentinos. É meio país. Mas a Argentina não é só Buenos Aires...”

Emilio intercala os assuntos de forma quase imperceptível. Do carnaval como expressão social, ele traça nossas semelhanças – “a classe média e seu pensamento são exatamente iguais nos dois países” -, fala sobre resquícios africanos na música típica de Córdoba, o cuarteto, vai para nossas músicas, que têm sempre a palavra “alegria” como lugar-comum, e chega ao Cinema, comparando obras que falam de um tema muito parecido, mas o tratam de formas diferentes, refletindo as diferenças entre Brasil e Argentina: Cidade de Deus e El Polaquito.

Quarenta e cinco minutos depois, eu nem lembrava que tinha ido ali para definir o meu futuro na universidade.

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